20 de julho de 2007

Tragédia & Filosofia













Filosofar é preciso


por SERGIO MATTOS GUERRA (meu irmão!)


Vale a pena ler !!!!


É comum ouvirmos hoje em dia que não há mais necessidade de filosofar.
"A Filosofia hoje é nada", brincou uma dramaturga brasileira na década de 90. Os arautos dessa modernidade afirmam que o importante é realizar-se, divertir-se, viver momentos alegres com familiares e amigos, viver plenamente o hoje, ser feliz. Quando se permitem filosofar, refugiam-se em alguma religião que lhes apresenta um menu de respostas prontas para todas as magnas perguntas da vida. Criam um "Deus" antropomórfico a quem julgam conhecer e com quem estabelecem pactos que lhes darão uma vida segura e feliz aqui na terra e um pós-morte de imortal júbilo.

Mas quando somos atingidos por uma tragédia como este último desastre do vôo da TAM, todas as nossas frágeis noções do que é ser feliz se estilhaçam na furiosa explosão dos acontecimentos. O nosso ente querido, que até ontem vivia feliz e seguro de que nada de mal iria lhe acontecer (já que as tragédias só acontecem com os outros e com os entes queridos dos outros) encontra-se hoje morto, carbonizado, irreconhecível, extinto, silencioso e ausente.


A nossa rotina corriqueira e banal é repentinamente mergulhada em desespero e estupor. Por mais que tenhamos sido felizes até ontem, hoje esta felicidade roubada já não vale mais nada.
Não nos conforta. Pelo contrário: quanto mais doce tenha sido nosso ontem de alegria e aconchego, mais cortante e amarga é nossa miséria depois do episódio trágico ("Em toda a adversidade do destino, a condição que gera mais infelicidade é o fato de se ter sido feliz ").

A religião também empalidece e os religiosos se dividem: os que tiveram seus entes queridos salvos da catástrofe rejubilam-se e, em arroubos de cegueira egoísta, louvam a Deus por ter sido tão bondoso com eles. Os que perderam seus amados gritam e revoltam-se contra os humanos que possam ter causado a tragédia, numa busca frenética por culpados. Não se vê nenhum deles agradecer a Deus pelo ocorrido, embora a Bíblia afirme que em tudo deve-se dar graças a Deus. Em outras palavras, tornam-se ateus, apesar dos habituais clichês religiosos que todos dizem nessas horas: "Foi a vontade de Deus", "não chore, ela está num lugar melhor", "um dia iremos nos reencontrar".

É numa hora como essas que brilha um fato tão antigo mas tão atual: a filosofia não morreu.
E nunca morrerá.
Simplesmente porque o homem nasceu para filosofar.
Ele tem a necessidade de se exercitar constantemente na arte de fazer as perguntas máximas da existência: "Quem sou eu?", "de onde vim e para onde vou?", "o que posso conhecer e o que devo fazer para conhecer?", "existe algo imortal em mim que não seja destruído pela morte?", "o que é o tempo?", "o que é real e o que não passa de ilusão?", "o que é a felicidade e como a poderei encontrar?", "há um Deus?", "é possível conhecê-lo?", "por que eu sou como sou e as coisas são como são?", "o que é possível mudar e o que tenho que aceitar?". O ato e o hábito de fazer estas perguntas é mais que simplesmente uma inclinação humana: é nossa vocação.

O exercício dessas indagações desenvolve os poderosos "músculos" do discernimento, e ao longo de muitos anos de prática, pode conferir a grande jóia da existência humana: a SABEDORIA.

A sabedoria não virá do estudo de livros e escrituras, nem da aceitação de dogmas religiosos, mas da profunda observação da vida aliada ao lento e paciente exercício de filosofar. Só a sabedoria, cultivada com humildade e paixão, será capaz de nos confortar de dentro do nosso peito. Só ela nos armará para vencer qualquer embate da vida e nos fará olhar para eles com serenidade e desapego. Só a sabedoria nos impedirá de enlouquecer se tudo o que tivermos for tirado de nós. Porque a sabedoria é, ela mesma, a única coisa nossa que não poderá ser tirada de nós. E não será isso a verdadeira e única felicidade? Todavia, poucas pessoas estão interessadas em buscar a sabedoria. Muitos filósofos nos ensinaram isso com suas próprias vidas e, principalmente, com suas mortes.

Mas o primeiro que me vem à cabeça é Boécio (Anicius Manlius Torquatus Severinus Boetius -- Roma, c.475/480 - Ticino, 524). Como filósofo platônico, estadista e teólogo romano, Boécio foi o último pensador latino a compreender o grego, sendo, portanto, a única fonte européia sobre esses textos digna de crédito, em sua época. Traduziu o Organon, de Aristóteles, e resumiu vários tratados sobre matemática, lógica e teologia. Sob o reinado de Teodorico, foi investido em altas funções administrativas, foi cônsul e magister palatii. Dando crédito a uma intriga política, o rei mandou executá-lo cruelmente em Pavia, em 525, depois de privá-lo do seu lar, suas propriedades e seus familiares, submetendo-o a uma longa prisão e muitas sessões de tortura.Foi na prisão que Boécio escreveu De Consolatione Philosophiae ( A Consolação da Filosofia) pouco antes de ser brutalmente executado.


Nessa obra-prima da literatura e do pensamento europeu, Boécio coloca-se na condição de um doente, por estar se perguntando de que lhe valeram tantos anos de filosofia e de princípios, se sua vida terminava como a de um malfeitor comum, sem conforto, sem afeto, sem integridade física. Então, no auge do seu devaneio ele tem uma visão de que a própria Filosofia, personificada em uma Dama de imortal encanto, vem até ele em sua cela e com ele dialoga sobre as palpitantes questões que o inquietam.


Todo esse sublime diálogo ele relata em A Consolação da Filosofia , onde vêm à baila os problemas do mundo, de Deus, da felicidade, da Providência, do destino, do livre arbítrio e, sobretudo, a questão do mal e da justiça divina. A Senhora Divina leva-o a compreender que, mesmo tendo perdido tudo e sofrendo dores atrozes, ele ainda pode e deve ser feliz, pois a verdadeira felicidade não pode ser roubada ou confiscada de nós por nada nem ninguém.

Ao final do poético diálogo, o filósofo não mais se encontra perplexo ou perdido. Ele está preparado para viver e morrer, tendo compreendido plenamente seu destino, abraçando sua sorte como um precioso tesouro. Este pequeno livro influenciou profundamente as maiores personalidades do pensamento e da arte européia, como Chaucer e Dante.

É verdade que pouco se fala da filosofia na rotina corriqueira dos homens e mulheres de hoje em dia. Como afirmou Bertrand Russell, o consultório da psicanálise é um dos últimos redutos onde ainda se pratica a maiêutica de Sócrates.
Mas as pessoas ainda se assustam com a psicanálise, taxando-a de tratamento para loucos, e preferem entregar suas mentes e seu dinheiro aos pastores de suas igrejas ou aos gurus da auto-ajuda, ignorando que não existe outra salvação ou auto-ajuda possível senão fazer um longo e profundo mergulho em si mesmo.


Que bom seria se filosofássemos mais. Que diminuíssemos um pouco o contato com a realidade para aumentar a análise desse contato, nas palavras de Fernando Pessoa no seu Livro do Desassossego. Que nos divertíssemos e ríssemos e desfrutássemos do convívio dos nossos amados sim, mas que buscássemos com igual empenho um pouco de solidão para compreender mais a natureza, o universo, nossas sensações, nossas emoções, nossas potencialidades, nosso EU.

Filosofando, tornamo-nos mais fortes, mais políticos, mais atuantes,mais felizes, mais espitiruais. Quem sabe assim, se um dia o Destino nos tirar aquilo que mais adoramos, em nossa hora mais escura a Majestosa Senhora Filosofia se digne vir ter conosco na restrita cela do nosso desespero, remova as ilusões dos nossos olhos e, consolando-nos e sorrindo, nos diga:
"Você é feliz!"

4 comentários:

Ivan disse...

a hora vai chegar...
sei q chegará, sempre chega!
te adoro Pat, patta, Patlicia, minha guia, minha amiga, minha escola... por isso pra mim, vale mais q a pena esperar.
bjbj

Camila Almeida disse...

véi...ele escreveu TUDO...perfeito...

li no email neh...e ateh repassei pra uma amiga minha do rio...

bjbj e como foi no Piola ontem?

Marcela Oliva disse...

Amiga, realmente as tragédias da vida nos fazem repensar muitas coisas. Ações, palavras, momentos. Fazemos o que falamos? Ou será que no nosso mundo somos hipocritas? Será que a filosofia é só algo que vemos nos livros da faculdade e não conseguimos aproximá-la do nosso dia-a-dia? Pq acontece isso? Pq dizem faça o que eu digo e não faça o que eu faço?

Acho que viajei hoje... vai ver que isso acontece de vez em quando.

Te adoro, viu? Admiração, respeito, sinceridade, em pouco tempo construimos uma relação de amizade com tudo isso e mto mais!

Fica com Deus, to aki para qualquer coisa (vc já sabe disso).
bjo-bjo

Marcela Oliva disse...

Tem gente que falou q ia atualizar o blog!!!!

hahahahahahaah

bjo-bjo